terça-feira, 10 de abril de 2012

Exercícios Respiratórios e a Prática da Serenidade

Na concepção do Taoismo serenar é gerar, com isso, os exercícios que ajudam na obtenção da serenidade têm também um efeito tônico para o organismo. As práticas introspectivas, que levam a pessoa a entrar em um estado profundo de serenidade, têm como característica a imobilidade e oferecem aos iniciantes maior dificuldade de serem aprendidas. Como consequência, gera resistência na hora de fazer e desestimula a sua prática em longo prazo. Ao contrário, os exercícios que envolvem algum tipo de movimento e, ao mesmo tempo, treinam a atenção de quem os pratica, favorecem a sua aprendizagem e têm uma dinâmica mais próxima do cotidiano, principalmente do mundo ocidental, em que a introspecção meditativa não faz parte do círculo exotérico de nossa cultura. Dentre estes, os exercícios respiratórios abdominais têm sido largamente utilizados como ponte de ligação entre o mundo da ação externa e o mundo da meditação. Com característica introspectiva sem exigir imobilidade, promovem a percepção de uma ação que aos poucos passa da sensação corporal externa para outra percebida internamente. A respiração abdominal é conhecida principalmente pelo seu efeito tônico da energia vital, mas quando é praticada de uma maneira mais lenta e interiorizada ajuda a serenar, porém, para se obter um melhor resultado, é muito importante conceber como isto acontece. Alguns pontos são relevantes neste sentido: o ritmo com que é feita a respiração, o deslocamento da atenção para o ventre, buscando focar-se na sensação física daquela região, e, também, a pulsação decorrente da intenção de expandi-lo na inspiração e do seu relaxamento/contração na expiração. Para potencializar mais ainda o efeito de relaxamento pode-se focar, durante a inspiração, na sensação física do corpo, sendo deslocada do ventre até a sola dos pés. Mas, principalmente, os efeitos benéficos desta prática vêm da ativação de um centro de energia que fica entre o umbigo e a coluna. Este centro de energia, conhecido como raiz do corpo físico e mãe de todos os centros de energia, é considerado o principal local de união e geração de energia vital no corpo, o seu nome é Tai Chi e o significado, na transmissão Taoista, é: o lugar no corpo de união das energias Yin e Yang (parte inferior e superior, Água e Fogo, Terra e Céu). Uma das dificuldades em fazer este treinamento vem da forma paradoxal que os Mestres Taoistas transmitem o conhecimento. Aconselham a buscar espontaneidade na ação do exercício e, para alcançar a serenidade, concebem como prejudicial, o excesso de concentração mental durante a prática. Com isso, o principiante fica perdido na dualidade da recomendação, em dúvida se é para ter ou não a intenção, fazer ou não o movimento. Com o aprimoramento na prática, que só vai ser alcançado ao ser constante e persistente, é possível compreender outra concepção para o termo intenção, que não está baseado na racionalidade. Perceber-se e sentir-se é diferente de pensar em si, o corpo sentido não é o corpo visualizado mentalmente. Assim, o aluno ocidental aos poucos descobre outra forma de acessar o conhecimento, diferentemente da forma usual de aprendizagem baseada na razão, acentuada pela necessidade do uso da linguagem para explicar a prática. Portanto, é no próprio fazer que o praticante descobrirá a limitação que possa advir da racionalização dos elementos que compõe o exercício e da ilusão que o conhecimento intelectualizado é o suficiente para aprendê-lo. A busca da espontaneidade é a busca de um fazer mais orgânico, em que memórias corporais possam ser despertas durante a prática, o que leva à descoberta do que os Taoistas chamam de “voltar a ser criança”. Relembrar aquilo que nos era espontâneo na infância, um estado de relaxamento e introspecção em que a energia vital fluía livremente pelo corpo. A prática do exercício respiratório abdominal pode levar a esta memória corporal, se, no entanto, não focar demais nos aspectos instrutivos formais. Então, aqui se entra no paradoxo, pois na hora de fazer a respiração busca-se agir sem agir, alcançar uma intenção que guarde em si o deixar acontecer. Ao fazer a prática, se obtém um estado de relaxamento, num primeiro momento, e há a tendência, muitas vezes em função do cansaço acumulado, de se cair no sono. Quando o exercício é feito antes de dormir, este efeito pode ser considerado benéfico à saúde, ao facilitar que a pessoa tenha um sono mais profundo e regenerador da energia. No entanto, se a busca do praticante é alcançar uma maior consciência corporal, ou especialmente entrar no estado meditativo, é preciso alcançar outra perspectiva de prática, em que serenar é diferente de relaxar e dormir. A serenidade passa a ser a consequência de uma atenção prolongada na região do Tai Chi e o resultado é um estado diferenciado de consciência, chamado pelos Taoistas de Vazio. O uso da palavra Vazio tem causado uma interpretação errada do seu real significado, principalmente quando é usada a expressão “buscar esvaziar”, para descrever a prática. A crença de que é preciso esvaziar a mente para conseguir serenar dificulta na hora de fazer o exercício, causando mais tensão do que relaxamento. O termo Vazio é tanto uma forma de descrever o Tao, como entrar no estado de meditação. Usar o Vazio para se referir ao Tao visa exprimir algo que não pode ser descrito, uma maneira de evitar dar forma àquilo que não tem forma. Qualquer característica atribuída ao Vazio o transforma em outra coisa. No livro escrito por Lao Tse – Tao Te King – é dito que: “O Tao que pode ser pronunciado não é o Tao eterno”. Quando o termo Vazio tem o intuito de descrever, o que acontece com a pessoa que entra no estado de meditação, fala-se de um estado de consciência em que a pessoa consegue perceber-se intensamente, mas não consegue descrever o que sente. Um momento em que não há pensamentos, sentimentos ou sensação física, não há palavras que o descreva e, por isso precisa, igualmente como no caso do Tao, de uma palavra especial que não busque explicar o inexplicável. A confusão se faz ao não entender que o esvaziar é um processo consequente da prática, algo que acontece espontaneamente e não algo conseguido a partir de algum tipo de esforço mental. Ingenuamente as pessoas ficam tentando parar de pensar e se irritando com isso. Ironicamente tentar parar de pensar não deixa de ser mais um pensamento. Portanto, a prática constante do exercício respiratório abdominal conduz à serenidade e à geração de energia vital.

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